Por: O Globo
De Laranjeiras à Vila do Pan, em Jacarepaguá, o corretor de imóveis Rômulo Camarinha acompanhou a rota de expansão da cidade nas últimas décadas. Ao comprar, em 2011, um apartamento com vista para a Avenida Ayrton Senna, ele não poderia imaginar que, dois anos depois, continuaria convivendo com graves problemas de infraestrutura: além do afundamento do terreno, volta e meia nota um vazamento de esgoto nos arredores. A expansão da cidade rumo à Zona Oeste — líder absoluta da cobiça das empreiteiras — representa um modelo exaurido e insustentável de desenvolvimento, segundo especialistas ouvidos pelo GLOBO. O presidente regional do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB-RJ), Sérgio Magalhães, afirma que essa situação pode ser ilustrada por números: entre 1960 e 2000, a população do Rio cresceu 86% (de 3 milhões para 5,6 milhões), e a área urbanizada subiu 222% (de 180 para 580 quilômetros quadrados). O fato de a cidade ter se espalhado fisicamente numa proporção bem maior do que o crescimento de seus moradores trouxe problemas, observa Magalhães:— Com a perda de densidade, fica cada vez mais remota a possibilidade de universalização dos serviços públicos, como água e esgoto, e segurança pública. As cidades mais desenvolvidas do mundo já reverteram esse processo de expansão.
Num caminho inverso, o designer Alexandre Pereira comprou a ideia de seus sócios de transferir a sede de um coletivo de empresas de Copacabana para a Zona Portuária. Os empresários ocuparam uma sala com o triplo do tamanho do escritório da Zona Sul e se dizem empolgados com a revitalização da área, que começa a atrair moradores. No Santo Cristo, por exemplo, o bate-estacas das obras do Porto Vida Residencial, um condomínio de sete prédios com 1.333 apartamentos ainda não colocados à venda, segue a todo o vapor.
O economista e professor da UFRJ Mauro Osorio, doutor em planejamento urbano e regional, também entende que o caminho das políticas públicas tem de seguir justamente na direção do adensamento da Zona Portuária e dos subúrbios, onde há emprego e infraestrutura. Uma das razões para a sua defesa de um modelo “antiexpansionista” é a queda da população de até 19 anos, de 7,5%, entre 2000 e 2010, no Rio:
— Essa nova realidade demográfica nas principais metrópoles leva os urbanistas a proporem políticas urbanas de adensamento e não de expansão.
Pesquisa da Associação dos Dirigentes de Empresas do Mercado Imobiliário (Ademi) mostra que Recreio e Jacarepaguá seguem inabalados nas primeiras colocações dos lançamentos imobiliários. Houve, porém, alterações no ranking dos bairros com mais unidades lançadas no primeiro semestre deste ano em relação ao mesmo período de 2012. A Penha surge na terceira colocação. E o Santo Cristo começa a colher frutos do repaginamento nos arredores da Rodoviária Novo Rio: aparece na quarta posição por conta de um único empreendimento, o já mencionado Porto Vida Residencial.
Mauro Osorio cita ainda outros números do Censo do IBGE e do Ministério do Trabalho. No Centro, na Zona Portuária e adjacências, moram 4,7% da população. Em contrapartida, é justamente nessa região central que trabalham quase 38% das pessoas com carteira assinada e dos funcionários públicos. No outro lado da moeda, a Zona Oeste concentra 26,9% dos moradores e tão somente 7,1% dos trabalhadores da cidade. O resumo de tudo isso: há muita gente tendo que cumprir, diariamente, longos deslocamentos de casa para o trabalho. Como o publicitário Lincoln Tesch, que trocou Vila Valqueire por Vargem Grande há oito anos. Ele passou a ter que se deslocar até Botafogo para trabalhar:
— Em busca de tranquilidade, centenas de pessoas desembarcam em Vargem Grande, que se torna um bairro mais populoso a cada dia. O bairro está totalmente abandonado e sem rumo. Nem água encanada temos. Esgoto? Nunca vi.
Dados da Secretaria municipal de Urbanismo também mostram, segundo Mauro Osorio, que o caminho rumo a um desenvolvimento urbano mais equilibrado ainda é longo. De janeiro de 2012 a agosto deste ano, o órgão licenciou quase 3,9 milhões de metros quadrados para construções residenciais na Zona Oeste e na Baixada de Jacarepaguá. Quatro vezes mais do que os menos de 830 mil metros quadrados aprovados para a região central e os subúrbios.
— Como é muito horizontal, a área suburbana pode ser adensada. Para isso, melhorias são fundamentais. Os bairros do subúrbio ainda estão muito abandonados — avalia Mauro Osorio.
Para a Zona Portuária, o economista defende uma regulação que permita um planejamento territorial mais efetivo:
— Hoje, os projetos para a área são, basicamente, de infraestrutura e de venda de imóveis. Em São Paulo, nas regiões centrais que estão sendo revitalizadas, só 50% dos empreendimentos podem ser empresariais. Os outros 50% devem ser residenciais, ou não é permitido construir.
Já Vicente Giffoni, presidente regional da Associação Brasileira dos Escritórios de Arquitetura, não acredita que o modelo expansionista para a Zona Oeste impeça o desenvolvimento das áreas central e suburbana. Ele considera inegável o interesse do setor imobiliário pelo subúrbio:
— Com a queda da violência, os imóveis valorizaram e há muitos lançamentos na região. Mas o poder público precisa criar novos parques como o de Madureira.
Vice-presidente da RJZ Cyrela, Rogério Jonas Zylbersztajn concorda. A construtora tem empreendimentos em bairros como Tijuca, Andaraí, Cachambi, Penha, Méier e Irajá:
— Esses lugares valorizaram muito com as UPPs — diz Zylbersztajn, ressaltando que a empresa aposta também no Porto. — O Centro antigo é focado em edifícios comerciais. A Zona Portuária precisa ser um novo bairro, com múltiplos usos.
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