terça-feira, 20 de agosto de 2013

Londres já desfruta do legado olímpico. A meta é fazer o mesmo com o Rio de Janeiro.

Por: O Globo

Reinaugurado oficialmente há duas semanas, o Parque Rainha Elizabeth — como passou a ser chamado o Parque Olímpico de Londres depois de 2012 — começa a revelar nova fisionomia. O estádio e a imensa escultura ArcelorMittal Orbit, um emaranhado de aço vermelho de gosto duvidoso, com 114 metros de altura, continuam lá, assim como o Centro Aquático da premiada arquiteta Zaha Hadid. Mas, pouco a pouco, as formas criadas para a realização das Olimpíadas vão tomando outros contornos e mudando para sempre as feições da região de Stratford. O bairro, com muitos imigrantes e menos favorecida, ganhou edificações modernas e uma boa rede de transportes. Com isso, passou a atrair novas tribos, como artistas e profissionais liberais.

Stratford caíra no esquecimento após a Segunda Guerra Mundial, quando sofreu bombardeios pesados. Antes, prosperava com a produção de alimentos e gim. Desse passado, restaram edifícios e armazéns abandonados.

— Nasci e me criei neste bairro. Há dez anos, quem nascia aqui queria ir embora. A região virou a lata de lixo de Londres, literalmente. Foram dois anos só para tirar as toneladas de pneus dos rios, para limpar solo de dejetos químicos antes de poder construir as estruturas das Olimpíadas — conta Pepe Martínez, filho de espanhóis e poloneses, hoje guia turístico especializado no bairro.

A 6 minutos do Centro

A infraestrutura construída para os Jogos diminuiu para seis minutos a distância entre Stratford, até então tida como afastada, e a estação de St. Pancras, no Centro de Londres. Vizinho da City, o coração financeiro da capital britânica, o bairro tem hoje a segunda estação de trem mais conectada da Europa. Em breve, deve se tornar mais um ponto de embarque para Bruxelas e Paris, do outro lado do Canal da Mancha.

Apesar da reinauguração do parque olímpico, as obras só acabam mesmo no ano que vem. Só um quinto da estrutura está aberta ao público agora. A parte sul do parque só será reinaugurada em abril de 2014. Por enquanto, tudo parece muito impessoal. Ao GLOBO, o arquiteto John Burrell, especialista no aproveitamento de espaços ociosos de grandes centros urbanos, diz que falta personalidade:

— Podia ser um bairro em qualquer lugar do mundo. Não parece confortável para as pessoas ainda.

As obras levaram para Stratford prédios modernos, com apartamentos de luxo, e hotéis cinco estrelas, que continuam brotando ao redor do parque, um dos empreendimentos mais caros dos Jogos de Londres. Grandes empresas de tecnologia, filiais de universidades e outras companhias também vão ocupando espaço na região.

O imenso Westfield Stratford, um dos maiores shopping centers da Europa, enche nos fins de semana e já é um dos preferidos dos turistas chineses. O estacionamento nas imediações vai abrigar uma grande pista de ski indoors, um investimento de R$ 220 milhões. Em setembro chegam os primeiros moradores dos prédios residenciais, que antes serviram como Vila Olímpica. Todos os imóveis foram vendidos a um grupo do Qatar.

O parque, que teve um investimento inicial de R$ 6 bilhões, já consumiu mais R$ 1 bilhão. As autoridades afirmam que, para cada 100 libras gastas no projeto, 75 correspondem a investimentos em infraestrutura de longo prazo. E, de fato, Stratford ganhou vida nova.

— Estive aqui há 12 anos. Não dá para acreditar no que aconteceu neste lugar — diz a jornalista Maria Lambert.

Apesar das boas notícias, o futuro da comunidade original de Stratford não está claro. Uma crítica recorrente é que os novos empreendimentos podem acabar deslocando a população de mais baixa renda, já que os preços dos imóveis subiram. O governo tem investido em políticas sociais para a integração da comunidade, mas nem sempre é possível evitar os velhos problemas de uma metrópole em crescimento. O Westfield Stratford, pro exemplo, tem sido alvo de criminosos.

Construções antigas buscam novos usos na área reformada

As enormes construções bilionárias dos Jogos tornam pequenos os imóveis antigos de Stratford. Um dos símbolos do bairro, um moinho d’água de 1776, enfeita uma ilhota em um dos canais recuperados pelo governo, mas não tem qualquer serventia. De seu telhado, onde se caminha com cuidado para evitar desabamentos, vê-se o estádio olímpico.

Hoje, moradores e especialistas lutam para conseguir recursos para recuperar esse ícone. As outras casas em volta do moinho fazem parte do Three Mill Studios, onde o cineasta Danny Boyle realizou os ensaios secretos das cerimônias olímpicas.

Parte dos prédios antigos de Stratford não recebeu um centavo dos mais de R$ 30 bilhões investidos nos Jogos. Por isso, buscam a revitalização na esteira do sucesso das Olimpíadas.

À beira de um dos canais, os velhos armazéns maltratados foram transformados em galerias de arte, café e restaurantes, lotados nos fins de semana. A pequena embarcação que desfila diante deles é um cinema flutuante e divide espaço com pequenos barcos de pescadores que voltaram ao local.

A Greenway, pista destinada a pedestres e bicicletas ao longo do parque, conta a história dos Jogos. Também há um centro cultural, com uma exposição de fotos e depoimentos dos voluntários de 2012 — muitos dos quais prometem participar das Olimpíadas do Rio em 2016.

Foi mantido ainda o prédio vermelho do Teatro Real Stratford East, de 1884. Ele divide a praça com outro centro cultural, com 17 salas de cinema.

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